O pessoal não sabia o que dizer, estava simplesmente maravilhado.
Afinal, o Rio Grande do Sul, nunca tinha visto nada igual: cerca de 15 mil jovens, durante três dias e três noites conviveram com plena liberdade, debatendo, ouvindo músicas, assistindo peças de teatro, dançando, ou apenas circulando pelo parque e tomando sol. Muita gente diferente de todo o Rio Grande do Sul, vestindo jeans, calções, biquinis, bombachas, e no frio da noite cobrindo-se com cobertores.
Também um considerável consumo de álcool. E nenhum desentendimento, nenhuma briga. Alguns bem humorados diziam que tudo estava na perfeita paz, porque não havia policiais no parque, ninguém para vigiar ou reprimir. Os dois rapazes que tiraram a roupa, no domingo, por exemplo, causaram certa curiosidade, mas apenas no início - um deles permeneceu nú a tarde inteira, e depois do primeiro impacto, ninguém mais prestou atenção a ele, que circulava com o corpo pintado de têmpera azul.
Nos caminhos e nos pavilhões vendiam-se jornais políticos, todo tipo de artesanato, camisetas com inscrições. Nos debates, que versavem as mais diferentes assuntos: mulher, ecologia, música, teatro, literatura, cinema, negro, política sindical, etc., havia sempre muita gente participando, perguntando e dando opiniões.
A proposta básica do Cio da Terra como o primeiro encontro da juventude gaúcha se realizava. Convivência era essa proposta, alimentada nos três dias do Cio por uma exemplar e elogiável auto-organização. Não havia nenhuma equipe encarregada de recolher o lixo, mas os organizadores distribuiram sacos de lixo e as próprias pessoas, espontaneamente, se encarregavam de limpar toda a àrea.
Através dos microfones trocavam-se recados, dava-se avisos e alertavam para que todos tivessem cuidado com fogueiras, que a disciplina da liberdade era importante para a a continuação deste e de outros Cios.
Não faltou comida, desde os pratos naturais, até os pratos feitos, passando pelo infalível e necessário "cachorro quente".
O chimarrão correu solto, não faltou bebida nem locais para a armação de barracas, embora os sanitários fossem pouco para tanta gente.
E naquela paz, uma sensação de alegria se multiplicava sob o sol e a lua cheia iluminando milhares de jovens que permaneceram diante do enorme (e muito bem projetado)palco de estruturas, duas noites inteiras, até o ciclo do sol se completar com a chegada dos primeiros raios de sol da manhã.
A sonorização da Odos e a iluminação da Focus foram perfeitas, dignas do palco e de quem subiu nele para cantar.
JUAREZ FONSECA
Matéria do Jornal Zero Hora - Porto Alegre - RS - 01/02/novembro/1982